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MORDIDELA

JOSÉ CARLOS MADEIRA

MORDIDELA

JOSÉ CARLOS MADEIRA

Zeinal - o anglo-saxónico, o amigo Henrique, o Lusitano e menina dos óculos de sol


O Principe

20.04.10

Escrevo este texto depois de este país ter começado assistir à maior tragicomédia parlamentar que têm sido as comissões parlamentares, para averiguar se o governo tentou ou não controlar um canal de televisão ( a TVI ) através da sua compra por uma empresa participada pelo estado, numa "Golden Share" que quanto a mim não tem sentido para existir. Só agora escrevo sobre o assunto porque não posso deixar de o fazer após escutar as declarações do ex-ministro do anterior governo socialista Mário Lino.

 

Mário Lino é daquelas personagens que se foi arrastando com sucessivas "gaffes" hilariantes que ajudou à queda da maioria absoluta socialista. Nunca mais Portugal esquecerá o seu anedótico "jamais" em relação à localização a sul do futuro aeroporto de Lisboa em privilégio da sua opção pela construção na Ota, como todos nos recordaremos também por muitos anos da sua argumentação em defesa da sua opinião ao classificar a margem sul do Tejo e todas as zonas circundantes como um deserto! Humilhante no mínimo para quem lá habita, sem entenderem porque uns anos antes alguns dos mesmos socialistas viabilizaram um enorme centro comercial em pleno deserto ( Freeport ). A falta de jeito para a exposição pública, a falta de dom da palavra e sentido politico e de perfil de estado é por demais evidente e confrangedora. Recordo-me de outro episódio, numa ida sua ao norte em visita ao Metro do Porto, ter querido puxar as orelhas aos autarcas envolvidos, pela derrapagem da obra, nomeadamente também a seus camaradas de partido, como o presidente da câmara de Vila do Conde, Mário Almeida,  esquecendo-se que o projecto fora ampliado envolvendo outros concelhos que não estavam previstos numa fase inicial. Numa demonstração ao chefe superior de possuir um estilo clonado de autoridade - esquecendo-se do seu Metro de Lisboa e os prejuízos na sua gestão. Mais uma vez com a sua aparição por duas vezes em comissões parlamentares tanto sobre a Fundação das Comunicações e esta última do Negócio TVI/PT, ficou bem patente o seu jeito atabalhoado, sempre com considerações de carácter, como se tratando alguém que os portugueses tomam por referência. Todas as suas intervenções são deprimentes quase fazendo transparecer que está a cumprir uma obrigação penosa de obediência ao seu anterior chefe, com um discurso demasiado colado à versão partidária e com trejeitos demasiados "seguidistas", o que fica bastante mal a quem ocupou um cargo tão relevante num Portugal que merece mais. Esta minha critica não é à pessoa e ao profissional e técnico de mérito que segundo sei é o " Eng. Mário Lino".

 

Esta aparição de Mário Lino fez-me pensar que todo este debate sobre a compra de uma estação de televisão por uma "Golden Share" do Estado e se o primeiro ministro conhecia ou não o desenrolar do negócio é completamente estéril, não dignificando o país que se encontra numa situação financeira precária. Exigia-se que este novo desenho politico-parlamentar se envolvesse em discussões mais vantajosas para a nossa credibilidade como nação num mundo financeiro cada vez mais dependente da economia global. Enquanto se divertem uns, outros andam por aí mundo fora escrevendo no "New York Times" e outros arautos mundiais artigos que nos colocam numa esfera perigosa da sociedade financeira que criará aos portugueses dificuldades acrescidas. Mas afinal quantas vezes já terá mentido o primeiro-ministro? Recordemos outras situações que o têm acompanhado, desde a sua queda para a arquitectura de gosto duvidoso..., passando pelo seu curso, as suas ligações e influências pessoais, o caso Freeport, e questionamos qual foi a consequência politica? Na razão porque perdeu a sua maioria absoluta de certeza que não tiveram um peso relevante os casos citados mas sim o seu não cumprimento de muitas promessas eleitorais, como o não aumento de impostos na primeira legislatura, o não desenvolvimento da economia, o crescimento do desemprego, o se manter tranquilamente sempre escudado pela crise mundial, falta de capacidade de dialogo e agressividade desproporcionada com alguns sectores da sociedade e profissionais e alguns ministros ridiculamente desajeitados como o caso citado. Estas sim são as razões verdadeiras razões para o combate politico. O que ainda não percebi de alguns sectores é qual será a consequência se eventualmente se concluir que o primeiro-ministro mentiu e tentou controlar a comunicação social - exigirão um pedido de desculpas (!!!), pedirão a sua demissão ou apresentarão uma moção de censura, o próprio se demitirá amuado por lhe chamarem mentiroso e certo que as sondagens na ocasião lhe são favoráveis? Por isto comecei com um texto neste blog, afirmando que desde o Sec. XIX a nossa classe politica pouco se tinha desenvolvido e o que se tem passado é a sua cabal demonstração. Dizia-me um amigo com muito acerto que o sector em Portugal que menos evoluiu foi o da politica, o que condiciona todos os outros.

 

Já se constatou que toda esta polémica já deveria estar encerrada e todos orientados para a construção de um outro tipo de sociedade e modelo de gestão do estado mas o surgimento de algumas personagens alimentam este triste episódio, mantendo alguns nas manchetes dos jornais e sobre o foco das luzes do imediatismo que as televisões proporcionam.  Também é de realçar que alguns dos principais actores que rodeiam o primeiro-ministro demonstraram uma incapacidade enorme de construir uma estratégia coerente e evidenciaram uma incapacidade confrangedora de lidar com uma situação como a que se verificou. Penso que  com "amigos" assim não seria necessário a José Sócrates oposição se a mesma também não fosse tão pouco esclarecida e desajeitada, tirando algumas honrosas excepções que as irei mencionando conforme o desenrolar da tragi-comédia.

 

Zeinal Bava, presidente da Portugal Telecom, teria sido o homem ideal para matar à nascença toda a polémica na grande entrevista à RTP, logo que se soube publicamente do negócio. A sua escolha para ir esclarecer o tema à televisão, resultou numa demonstração plena que o mesmo não se dá bem com as lides politicas, o seu tom pouco convivente, sua deficiente argumentação deixou no ar de quem viu e de alguns espíritos trágicos que povoam a nossa sociedade que mais alguma coisa se passou. Em Zeinal Bava não discuto a sua capacidade de liderança e de gestão, mas faço-o em relação à sua imagem, à sua capacidade de gerir publicamente uma crise e uma situação como esta. Depois deste episódio de certeza que os seus créditos junto da opinião publica ficaram irremediavelmente comprometidos, não deixando de ser visto por culpa própria como um possível "self made man" e instrumento de José Sócrates, o que na minha opinião é injusto. O seu grande pecado foi ter acedido a ir à grande entrevista e não ter tido capacidade de terminar com toda a especulação e controvérsia - quando o Cabo lida o touro não lhe é permitido o fracasso como a qualquer dos outros forcados!

Como não entendeu este problema que criou, a sua aparição na comissão parlamentar acabou por ser apenas mais um episódio desajeitado e por vezes irritante. Pouco acrescentou  e como lhe era exigido deixasse implacavelmente a oposição comprometida e centralizasse  toda a questão para a opinião pública como apenas um episódio de negócios como outros tantos entre as duas grandes empresas! Não acertou na sua estratégia e falhou de forma gritante no modo como se exibiu como gestor e profissional. para quem acompanhou em directo as suas declarações, soou mal em plena comissão parlamentar tratar o seu superior como " o Henrique" ou outras tantas vezes fazendo transparecer despropositada uma imagem de grande cumplicidade - " o Henrique e eu... ""...Algumas vezes eu já fui presidente do Henrique outras ele meu...." - As alusões que fez por mais de uma vez em relação à sua formação anglo-saxónica, sugerindo que devido à qual não conseguia entender situações como as que se discutiam, numa atitude de patética superioridade curricular, não foram brilhantes. No final, emendou o erro e  começou a se referir ao seu superior como o "Dr. Henrique Granadeiro", mudando o seu discurso que até então à colava a imagem que a PT seria uma espécie de feudo de dois amigos - Zeinal -  o anglo-saxónico e o amigo Henrique, o Lusitano. Abusou de expressões em inglês, talvez querendo realçar a sua dita formação e modernidade mas o que ficou foi uma imagem de um gestor pedante preocupado com o se poder, daqueles que em vez de mandar imprimir pede um "print", que quando se refere aos superiores hierárquicos ou aos seus pares fá-lo pelo primeiro nome  ( o caso do " o Henrique" ), marca "meetings" em vez de reuniões, fala em "deadlines" em vez de prazos. Ao nível da própria argumentação soou a toda a nação algumas respostas que deu aos deputados como sobranceria ou inabilidade - responder que Rui Pedro Soares Dias esteve presente numa ( ou várias ) reuniões que decidiram o negócio porque era quem estava livre ou disponível não convenceu até o cidadão mais desatento. O nível de gestão da PT, não permite que alguém acredite que um administrador é escolhido para participar numa reunião sobre um negócio tão importante, pelo critério de estar disponível ou livre naquele momento. Se acrescentarmos a tudo isto a também desajeitada e sobranceira passagem do Dr. Henrique Granadeiro pela mesma comissão, brindando os presentes entre outros momentos com "popularuchos" ditados pessoais e do toque constante e irritante do seu telemóvel, concluiremos que não foi justo para a sua própria de excelentes gestores que encontramos neste país mesmo percebendo a irritação da discussão e embaraço deste tema num parlamento da forma como está feito.

 

Este episódio de Henrique Granadeiro, só foi ultrapassado por outro protagonizado pela presença de uma deputada de semblante ensonado que durante largo tempo na sessão em que esteve presente Zeinal Baval ostentou os seus excelentes óculos de sol na cabeça, fazendo recordar outros sítios e outras reuniões ( como de um ensaio de uma peça de teatro, por exemplo uma tragicomédia... ). É demais evidente que a principal casa da democracia é por demais frequentada com falta de civilidade e ética, por muito que baptizem com o seu nome comissões parlamentares. Já nos habituamos a ver constantemente alguns deputados a se dirigirem ao plenário e hemiciclo com as mãos nos bolsos, outros interrompendo e elevando a voz com apartes deslocados acima da do orador ...qual fadista à desgarrada numa taberna de Alfama ou do Bairro Alto ou no Norte na Velha Ribeira do Porto ou na mística Afurada das tardes de fado - mas ficando a perder porque para se ouvir o fado em todos esses locais é exigido respeito e silêncio para com o artista.

 

Dizia um fadista numa sessão de fado à tarde numa taberna da Afurada, a uns cavalheiros que entraram deslocados e barulhentos quando ele se preparava para cantar  - meus senhores silêncio e respeito que isto é uma casa de fado e não uma sessão do parlamento...e o povo presente aplaudiu, riu e ouviu mais uma desgarrada.

 

José Carlos Madeira

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